quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

STF retoma hoje julgamento 'chave' para terras indígenas

O Supremo Tribunal Federal retoma nesta quarta-feira, dia 10, o julgamento do caso da reserva indígena de Raposa Serra do Sol, considerado um dos mais complexos da história da corte.

Os membros do Supremo terão de decidir se a reserva, localizada ao norte do Estado de Roraima, deve ser dedicada exclusivamente aos índios ou se os brancos também têm direito à terra.

A importância da decisão vai além da disputa entre indígenas, políticos e agricultores locais. Isso porque o julgamento de Raposa Serra do Sol deverá servir de parâmetro para casos similares em todo o país.

Existem cerca de 140 processos relativos a demarcações de terras indígenas no Brasil tramitando nas diversas instâncias. A decisão do STF não precisa ser adotada obrigatoriamente, mas passará a ser vista como base para as próximas decisões sobre o assunto.

"Espero que esse julgamento seja relevante não só para o caso (Raposa), mas que consigamos extrair paradigmas para outros casos", disse o presidente do Supremo, Gilmar Mendes. Segundo ele, é preciso avançar nesse âmbito, "mas sem insegurança jurídica".

Desde 2004, 72 processos sobre demarcação de terras indígenas foram ajuizados no STF, sendo que seis encontram-se em movimentação interna na casa.

No final de setembro, uma ação para retirada de fazendeiros da reserva indígena Caramuru-Paraguaçu, no sul da Bahia, também teve seu julgamento adiado pelo STF em função de pedido de vista do ministro Carlos Alberto Menezes Direito.

O relator do caso, ministro Eros Grau, votou a favor da retirada dos não-índios da região. A ação foi impetrada pela Fundação Nacional do Índio e há 26 anos tramita no Supremo.

Debate

O caso de Raposa Serra do Sol trouxe à tona um debate que vai além da demarcação de uma reserva indígena. Temas como segurança nacional, respeito à Constituição e desenvolvimento econômico também têm sido levantados.

Diversos atores participam do debate, entre eles o governo federal, políticos locais, grupos indígenas, organizações não-governamentais (ONGs), associações de classe, militares e acadêmicos.

A lista de argumentos também é extensa – para ambos os lados. Um exemplo é quanto à presença dos índios em regiões de fronteira, como no caso de Raposa Serra do Sol, no limite com Venezuela e Guiana.

O grupo contrário à demarcação contínua da reserva, como o governo estadual, políticos e militares, diz que a região da fronteira, para ser devidamente patrulhada, exige a presença dos pelotões do Exército.

"Uma de nossas sugestões é que se exclua da reserva 15 quilômetros para dentro da linha de fronteira", diz o senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR).

Já os que defendem a demarcação contínua, como antropólogos, ONGs e grupos ligados à defesa dos índios, argumentam que o Exército não está proibido de entrar na região quando necessário, e que os índios, ao defenderem suas terras, acabam colaborando para a preservação da fronteira.

"Um dos grandes problemas é que as pessoas contrárias à demarcação contínua são profundamente antiindígenas e têm outros interesses", diz a ativista Fiona Watson, da ONG Survival International.

Um general do Exército, que prefere não se identificar, diz que o mais importante sobre o caso Raposa Serra do Sol é que o assunto, após duas décadas "escondido", passou a ser tratado de forma pública. "Agora toda a sociedade sabe o que está em jogo", diz.

Histórico

A ação impetrada pelos senadores Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) e Augusto Botelho (PT-RR) questiona a legalidade da demarcação de uma área contínua de 1,7 milhão de hectares para a reserva. A demarcação da região foi homologada em 2005, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

No final de agosto, o caso foi a julgamento no Supremo, mas a decisão teve de ser adiada em função do pedido de vista do ministro Menezes Direito.

Durante a sessão, o relator do caso, ministro Carlos Ayres Britto, votou pela demarcação contínua, ou seja, sem qualquer área destinada aos brancos.

A decisão causou surpresa, pois havia expectativa de uma decisão que propusesse uma solução intermediária.

Em seu voto (que tem 105 páginas), o relator Ayres Britto disse ser contra a divisão do território como um “queijo suíço”, que, segundo ele, se caracterizaria como “asfixia espacial” e “confinamento sem grades” para os índios.

Mesmo após o período regulamentar para análise do caso, a pedido do ministro Menezes Direito, não há garantias de que decisão saia nesta quarta-feira, já que outros membros do Supremo também podem pedir vista do processo.

No entanto, os ministros têm comentado em diversas situações sobre a importância de o julgamento sair ainda este ano.

O governador de Roraima, José de Anchieta Júnior, pediu urgência no julgamento, pois, segundo ele, o adiamento poderia criar “certa animosidade entre as partes”.

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