Por Ernesto Caruso
O Decreto nº 1.775/96, que dispõe sobre o procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas, cita como amparo legal o Art. 84, inciso IV e o disposto no Art. 231, o que inclui os seus parágrafos, ambos artigos da Constituição/88, e o Art. 2º, inciso IX da Lei n° 6.001, de 19 de dezembro de 1973, que é o Estatuto do Índio.
Vejamos cada um desses suportes.
- O Art. 84, inciso IV diz que compete privativamente ao Presidente da República “sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução.”
- O Art. 231 ressalva que “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.”
- O Art. 2º da Lei n° 6.001, de 19 de dezembro de 1973, já lembrado na apreciação do Estatuto do Índio, determina que “Cumpre à União, aos Estados e aos Municípios, bem como aos órgão das respectivas administrações indiretas, nos limites de sua competência, para a proteção das comunidades indígenas e a preservação dos seus direitos; ....” e o seu inciso IX complementa, “Garantir aos índios e comunidades indígenas, nos termos de Constituição, a posse permanente das terras que habitam, reconhecendo-lhes o direito ao usufruto exclusivo das riquezas naturais e de todas as utilidades naquelas terras existentes;”
Não há dúvida quanto à vontade expressa no Art. 231/CF que reconhece aos índios o direito originário sobre as terras que ocupam.
Mas, também há que se reconhecer o afunilamento que uma premissa falsa provocou, a partir de um único artigo da Constituição, o Art. 231, centralizando o poder de decisão, aproveitando a Lei 6.001/73, que lembra a garantia, nos termos da Constituição (era a de 67/69), o Decreto 1.775/96, ao prescrever que as terras indígenas serão administrativamente demarcadas por iniciativa e sob a orientação do órgão federal de assistência ao índio, i. é. FUNAI, fundamentada em trabalhos desenvolvidos por antropólogo de qualificação reconhecida. Um antropólogo passa a ser o Senhor da Decisão.
Por outro lado, os termos da Constituição em vigor, a de 1988, não são exatamente os mesmos da Constituição de 67/69.
É ponto pacífico se admitir que as terras indígenas são bens da União (Art. 20, XI, CF/88).
A faixa de fronteira de até 150 km também se enquadra como bem da União, conforme o Art. 20, §2º, cuja ocupação e utilização, serão reguladas em lei. O DSN de 15/04/2005, que homologa a TI Raposa Serra do Sol estabelece o seu limite com o seguinte texto: “partindo do marco SAT RR-13=MF BV-0, de coordenadas geodésicas 05º12’07,662" N e 60º44’14,057" Wgr., localizado sobre o Monte Roraima, na trijunção das fronteiras Brasil/Venezuela/Guiana, segue pelo limite...” Isto é, exatamente na linha de fronteira.
As terras indígenas e a faixa de fronteira são consideradas bens da União, e em conseqüência, pelo Art. 48, V, “Cabe ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, não exigida esta para o especificado nos arts. 49, 51 e 52, dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente sobre:....V, limites do território nacional, espaço aéreo e marítimo e bens do domínio da União;”. Prosseguindo no Art. 48, o inciso VI é contundente no que se refere à “incorporação, subdivisão ou desmembramento de áreas de Territórios ou Estados, ouvidas as respectivas Assembléias Legislativas;”
Ora, alteram limites dos municípios, eliminam municípios, desconstroem o Estado de Roraima, transformam por decreto áreas do Estado em bens da União, apartando o Congresso Nacional e sem ouvir a Assembléia do Estado.
Ocorreu uma fragmentação de Roraima ou esse Estado nunca existiu.
Ou deve valer a palavra de um antropólogo afiançando que todo o espaço considerado é terra tradicionalmente ocupada por índio.
E o Congresso não debate, não legisla?
Não cumpre o seu papel constitucional de dispor sobre todas as matérias de competência da União que dele dependem com a sanção do Presidente da República.
Ernesto Caruso é Coronel da Reserva do EB.
Postado por Alerta Total de Jorge Serrão
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