domingo, 8 de junho de 2008

Alterações na saúde indígena

Governo copia modelo do SUS para atender tribos e retira gestão de recursos da Funasa
Hércules Barros
Da equipe do Correio
Em uma tentativa de tirar a saúde da população indígena da agonia, o governo vai mudar a forma de gerir as ações de combate aos males que acometem os índios. A estratégia será apresentada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva a líderes das tribos no próximo dia 19, no Palácio do Planalto. A proposta faz parte das alterações da política indigenista do país, mas o modelo não é novo. Adota para a saúde do índio o mesmo modelo implantado para estados e municípios com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) há 20 anos: descentralização, com administração direta dos recursos para a área.
Com a implantação da medida, a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) terá de repassar diretamente aos 34 Distritos Sanitários de Saúde Indígena distribuídos pelo país os cerca de R$ 150 milhões destinados para convênios com organizações não-governamentais e universidades que atuam no atendimento médico a povos indígenas onde o governo não tem estrutura para agir sozinho. A intenção é evitar que as instituições que prestam o serviço na ponta relaxem na realização de procedimentos por falta de fiscalização. Os contratos com essas instituições são fechados e geridos pela Diretoria de Saúde Indígena da Funasa, em Brasília.
“A gestão fica mais próxima do usuário”, justifica o diretor do Departamento de Saúde Indígena (Dsai) da Funasa, Wanderley Guenka. A autonomia dos recursos pode agilizar o atendimento principalmente nos seis distritos sanitários da região amazônica, longe de Manaus e que concentram 45% da população indígena do país. “Facilita o processo de aquisição e compra de alimentos e medicamentos”, exemplifica. O controle social ficará a cargo dos conselhos distritais de saúde indígena. “Eles vão saber o orçamento dado para o distrito, como é aplicado e onde está o profissional contratado”, diz Guenka.
Para a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Subnutrição de Crianças Indígenas na Câmara dos Deputados, os convênios entre Funasa e ONGs para a contratação de recursos humanos devem ser extintos. A observação faz parte das 34 recomendações que constam no relatório final da CPI, formada em decorrência da crise na saúde indígena deflagrada pela desnutrição de crianças guarani-caiouás, em Mato Grosso do Sul, há três anos. “A medida talvez represente uma pequena melhora, mas faltam profissionais motivados pela causa indígena”, ressalta o sertanista Sydney Possuelo. O especialista lembra que é importante que a administração da verba esteja sob a coordenação dos indígenas e não de burocratas. “Eles sabem das necessidades que passam. Transferir a responsabilidade para um administrador local não resolve o problema. Os índios é que têm de administrar os recursos”, afirma.

“Ruim demais”
Sem citar nomes, Guenka reconhece a precariedade de alguns convênios de terceirização da Funasa. “Tem ONG que é ruim demais”, diz. No entanto, pondera: “Um termo de conciliação judicial, conseqüência de uma ação civil pública em dezembro do ano passado, prevê a substituição dos 13 mil funcionários conveniados por pessoal concursado”, observa. A troca vai até 2011, mas até junho do próximo ano a Funasa terá que substituir 20% dessa força de trabalho. Ou seja, substituir 2,6 mil profissionais de saúde que atendem nas aldeias.
Guenka admite que atrair candidatos a uma carreira pública nos confins do Brasil é um desafio que necessita de incentivo, principalmente para a área médica. “Para trabalhar no Vale do Javari (oeste do Amazonas), onde se levam 15 dias para chegar nas comunidades, tem que ter uma atração muito grande”, afirma. Uma gratificação que dobre o salário seria um bom chamariz, na avaliação de Guenka. “Se não for sedutor, não vai ter quem queira”, justifica. De acordo com Guenka, mesmo oferecendo um salário de R$ 10 mil, não se consegue médicos para atuar na localidade. Na região moram 3,7 mil índios. A média de salário para outros profissionais de saúde na região é de R$ 5 mil. De acordo com a Funasa, a saúde indígena enfrenta um déficit de 300 médicos.

O número
Fim dos acordos
R$ 150 milhões é o valor destinado hoje pela Funasa a convênios com ONGs e universidades para atendimento médico a índios.

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