Para chanceler, paciência do Brasil não pode ser confundida com complacência
Florencia Costa* e Eliane Oliveira
NOVA DÉLHI e BRASÍLIA. A relação comercial entre o Brasil e o Equador pode chegar ao fim caso o empréstimo junto ao BNDES não seja honrado, afirmou o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, ontem à noite em Nova Délhi, pouco antes da chegada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao hotel Taj Palace. Amorim disse ainda que a paciência do Brasil não pode ser confundida com complacência.
- Então, vai acabar o comércio entre Brasil e Equador, porque o empréstimo é lastreado no CCR (Convênio de Pagamentos e Créditos Recíprocos). Eu não entendo como deixar de pagar porque tem a garantia do CCR, que é uma garantia comercial - afirmou Amorim, que junto com outros ministros acompanha Lula hoje na cúpula do Ibas (Índia, Brasil e África do Sul), lembrando que o presidente Rafael Correa sempre lhe disse que desejava a presença de empresas brasileiras no Equador. - Não queria dizer nada para não soar ameaça. Não é necessário fazer ameaça.
Ao ser cobrado por um jornalista sobre uma ação no Equador, Amorim reagiu:
- O que é que você quer que eu faça? Que eu invada o Equador? Temos de ter paciência, temos interesse em manter boas relações com o Equador. Agora, a paciência, num determinado momento... Não estou dizendo que a gente perde a paciência, mas não pode confundir paciência com complacência.
O chanceler disse ainda que há muitos ministros dando palpites nessa história e que "quando o clima não é favorável, é melhor não falar", mas afirmou:
- Quanto mais vocês perguntam, mais dificultam as negociações, porque a tentação da retórica é muito grande.
O assessor especial da Presidência Marco Aurélio Garcia também criticou o excesso de palpites e defendeu um entendimento direto entre os presidentes Lula e Correa:
- Quando tem muita gente falando, dá cacofonia.
Perdas do país vizinho com ataques chegariam a US$1 bi
Os ataques de Correa a empresas brasileiras podem custar ao Equador, por baixo, cerca de US$1 bilhão que seriam investidos pelo Brasil no Plano de Conexão Multimodal dos portos de Manta e Manaus (AM), passando por território peruano. O eixo beneficiaria o Equador com uma rede de estradas e hidrovias. Conforme o próprio Correa confidenciou a Lula, trata-se do maior projeto de seu governo.
As perdas equatorianas podem ser ainda maiores, já que o projeto facilitaria o transporte de produtos daquele país à Zona Franca de Manaus e à Amazônia em geral. Seria uma forma de se reduzir o alto superávit comercial a favor do Brasil no intercâmbio bilateral, que, somente entre janeiro e setembro deste ano, foi de US$582 milhões.
Até o Brasil cancelar a ida de uma missão do Ministério dos Transportes a Quito, na última quinta-feira, estimava-se que as obras do Plano Multimodal pudessem começar em agosto de 2009, com conclusão prevista para agosto de 2011. Agora, informaram fontes da área diplomática, está tudo suspenso.
A crise diplomática começou mês passado, quando Correa puniu a Odebrecht, determinando o seqüestro dos bens, a militarização dos canteiros de obras e a proibição de saída do país de funcionários da empreiteira brasileira. Ele também ameaçou não pagar um empréstimo do BNDES para a construção da hidrelétrica San Francisco, de US$242,9 milhões.
No fim deste mês, Lula e Correa se encontrarão na cúpula de presidentes da América Latina e Caribe, em El Salvador. Em 5 de novembro, haverá uma audiência pública na Câmara, com a participação de Amorim.
(*) Correspondente
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