quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Proer de Lula é mais poderoso

Banco Central terá condições inéditas para salvar bancos em apuros

Vicente Nunes

Da equipe do Correio

 

Crítico ferrenho do socorro a bancos durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, por meio do Programa de Reestruturação do Sistema Financeiro (Proer), o presidente Lula não resistiu aos abalos da crise internacional no país e criou o seu próprio Proer ao assinar, na noite de segunda-feira, a Medida Provisória 442.

O Proer de Lula deu, no entanto, muito mais poderes ao Banco Central para ajudar instituições em dificuldade do que o extinto programa, que, entre 1995 e 1998, evitou a derrocada do mercado bancário nacional. No entendimento dos especialistas, da forma como foi escrita, a MP abre a possibilidade de estatização de bancos socorridos, caso os empréstimo concedidos pelo BC não sejam honrados por essas instituições.

O raciocínio dos especialistas é o seguinte: a MP permite ao BC aceitar uma série de garantias como contrapartida à compra de carteiras de crédito de bancos, inclusive as ações pertencentes aos donos das instituições. Essas ações se enquadrariam no que a MP denomina “garantia real”. A estatização, porém, é considerada como uma medida extrema, uma vez que as principais garantias nas negociações entre o BC e os bancos que precisarem de sua ajuda são as carteiras de crédito, muitas delas cotadas a valores superiores às necessidades imediatas de caixa.

“Apesar do entendimento do mercado, é importante ressaltar que ainda não está certa a aceitação de ações dos bancos como garantia à ajuda do BC. A definição das garantias será feita, em breve, por meio de regulamentação do Conselho Monetário Nacional (CMN)”, disse um técnico do BC. Ele admitiu, porém, que, com a MP, o Banco Central ganhou muito mais força para agir em momentos de crise. E, melhor, com todas as suas ações respaldadas em lei.

O Proer de Lula permite, ainda, que os bancos socorridos pelo BC possam ter dívidas com o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e tenham os nomes inscritos no Cadin, o cadastro de inadimplentes da União. No programa de FHC, isso era vedado. Os bancos socorridos tinham de apresentar certidões negativas de todas as operações com o setor público. A única restrição mantida pela Proer de Lula é o débito com a Previdência Social, pois a Constituição não permite que devedores se beneficiem de ajuda do governo.

Outra diferença entre o Proer de Lula e o de FHC é a execução das garantias dadas aos empréstimos. Pela MP 442, se um dos bancos socorridos quebrar, o BC poderá resgatá-las imediatamente, pois não entrarão na massa falida. Pelo programa anterior, os créditos em poder do BC entravam na lista determinada pela Justiça, além de serem alvo de disputas nos Tribunais com os ex-controladores dos bancos, atrasando as decisões por anos. O Banco Nacional, por exemplo, sofreu intervenção em 1995 e até hoje não há solução para o processo conduzido pelo BC.

Para Carlos Eduardo de Freitas, ex-diretor da Área de Desestatização e Reestruturação do BC, a MP 442 é um avanço importantíssimo. Segundo ele, desde a extinção do Proer, o BC ficou sem instrumentos ágeis para enfrentar momentos graves como o atual, em que o mundo inteiro enfrenta uma crise de confiança em relação ao sistema financeiro. Freitas lembrou que, durante sua gestão no BC, preparou um amplo projeto de reformulação da Lei 6.024, que trata das liquidações extrajudiciais.

O projeto, contudo, acabou não avançando porque ninguém da atual diretoria quis comprar a briga no Congresso para dar mais poder à instituição. Temia-se a acusação de que o BC estaria querendo ressuscitar o Proer. “Com a crise, alguns dos instrumentos de ação do BC vieram por MP. Mas o importante é que o BC disponha de todos os instrumentos para agir quando necessário”, afirmou Freitas. Essa avaliação também foi feita por Vitória Saddi, analista para a América Latina da Consultoria RGE Monitor, com sede em Nova York. “Agora, sim, o BC brasileiro está equipado com o mesmo poder de fogo dos principais bancos centrais do mundo para enfrentar as turbulências internacionais”, disse.

“O importante é que o BC disponha de todos os instrumentos para agir quando necessário.”

Carlos Eduardo de Freitas, ex-diretor da Área de Desestatização e Reestruturação do BC

 

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