domingo, 19 de outubro de 2008

Brasileiros relatam ações na 4ª Frota

Médicos da Marinha do Brasil atuam em missão humanitária da esquadra americana, reativada neste ano

Principal navio da frota que faz operações no Caribe, o USS Kearsarge também é ideal para combate; envio foi motivos de protestos

RICARDO BONALUME NETO

DA REPORTAGEM LOCAL

 Principal navio da 4ª Frota americana, o USS Kearsarge está realizando operações de ajuda humanitária no Caribe. A bordo do imenso navio anfíbio, atualmente na República Dominicana, estão dois médicos da Marinha do Brasil. Quando os EUA decidiram recriar a 4ª Frota para atuar nos mares em torno da América Latina, a gritaria foi geral, especialmente entre a esquerda, temerosa de uma nova era de intervenções militares. Os EUA alegaram que era uma simples medida administrativa e que a esquadra atuaria em exercícios conjuntos com Marinhas de países da região, além de prover ajuda humanitária.

O USS Kearsarge é capaz de servir bem a qualquer das intenções. Trata-se de um navio de assalto anfíbio, um gigantesco porta-helicópteros de 45,5 mil toneladas em plena carga, dedicado ao desembarque de fuzileiros navais. Sua tripulação é de 1.200 oficiais e marinheiros e 2.000 fuzileiros navais. Tem mísseis para defesa antiaérea e costuma levar seis aviões de ataque AV-8B Harrier e cerca de 23 helicópteros. Mas, além disso, tem instalações médicas que só perdem em tamanho para as de um navio-hospital. Há seis salas de operação, 578 leitos para doentes e amplo espaço para veículos e carga. Ou seja, é um excelente navio para realizar o que a Marinha do Brasil chama de "aciso" -ação cívico-social.

A missão atual de assistência médico-humanitária chama-se Continuing Promise 2008 ("promessa continuada"). Estavam previstas visitas a seis países, mas o Haiti foi incluído na lista depois de sofrer com as tempestades Gustav e Hanna e o furacão Ike.

Um dos brasileiros a bordo é o capitão-de-corveta (médico) Thomaz Moraes do Carmo, formado pela Universidade Federal do Pará. Na Marinha desde 1996, ele serve no Hospital Naval de Belém. Moraes tem larga experiência de missões de atendimento à população ribeirinha, no rio Amazonas, a bordo do Navio de Assistência Hospitalar Oswaldo Cruz. O outro é o capitão-tenente Ricardo Silva Guimarães, formado pela Faculdade de Medicina de Campos. Ele entrou para o Exército em 1998 e em 2000 se mudou para a Marinha. Atuou no Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade e foi à Antártida a bordo do navio oceanográfico Ary Rongel, entre 2005 e 2006. Os dois concederam entrevista à Folha conjuntamente, por e-mail, quando estavam ao largo do Haiti.

 

FOLHA - Como foi que surgiu a oportunidade de estar a bordo de um navio da Marinha dos EUA?

THOMAZ MORAES DO CARMO E RICARDO SILVA GUIMARÃES - A Marinha americana convidou dois médicos da Marinha do Brasil a participarem desta missão. Uma das vagas foi oferecida ao Hospital Naval de Belém, por seus médicos terem grande experiência com doenças tropicais. Com isso, o capitão-de-corveta Thomaz foi voluntário. A outra vaga foi decorrente de processo seletivo da Marinha, tendo sido selecionado o capitão-tenente Ricardo.

 

FOLHA - Em quais países estiveram e de que tipo de atividades participaram? Como se comparam com experiência semelhante de ação cívico-social que realizaram no Brasil?

THOMAZ E RICARDO - Estivemos em Puerto Cabezas, na Nicarágua, e Santa Marta, na Colômbia. O capitão-de-corveta Thomaz realizou atendimento médico primário. O capitão-tenente Ricardo participou de seleção dos pacientes cirúrgicos em terra, tendo realizado as cirurgias a bordo do USS Kearsarge. O tipo de atendimento e as patologias são semelhantes aos do Brasil, porém a população nos pareceu mais carente em saúde e saneamento. A logística americana é maior, devido à natureza da missão, que não se restringe à área médica, com realização de obras de infra-estrutura, como reformas de escolas e hospitais.  

 

FOLHA - Como é a vida a bordo de um navio dos EUA? Sentem-se à vontade ou sofrem de alguma forma de "choque cultural"?

THOMAZ E RICARDO - A convivência a bordo é harmônica e amigável. Não houve nenhum tipo de "choque cultural", visto que já temos alguma experiência com a rotina a bordo de navios da Marinha. Houve, sim, um grande interesse dos americanos em aprender um pouco mais sobre o Brasil. Por ser um navio de grandes dimensões, há uma infra-estrutura maior, o que facilita a vida a bordo.

 

FOLHA - Onde estão no momento, fazendo o quê? Tiveram contato com as tropas brasileiras da missão de paz no Haiti?

THOMAZ E RICARDO - Estamos ao largo de Porto Príncipe, no Haiti. Neste país foi realizado apenas apoio logístico, pelas aeronaves de bordo, na distribuição de alimentos. Estivemos em terra como voluntários, apenas para ajudar no transbordo dos alimentos para os helicópteros, no aeroporto local. Nós não tivemos contato com a população e as tropas brasileiras.

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