quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Brasil ameaça romper comércio

Quito estuda não pagar empréstimo ao BNDES e ministro Celso Amorim alerta que a ação representaria o fim das relações de mercado. Prazo para executivos da Odebrecht e de Furnas deixarem o país vence hoje

Viviane Vaz

Da Equipe do Correio

 

A tensão nas relações entre Brasil e Equador aumenta a cada dia depois que o presidente Rafael Correa decidiu expulsar do país a construtora Odebrecht e a estatal brasileira Furnas. O secretário nacional Anticorrupção do Equador, Alfredo Vera, disse ontem que seu governo não quitará o empréstimo de US$ 243 milhões concedido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Correa sustenta que a quantia foi destinada à Odebrecht para a construção da hidrelétrica de San Francisco, e não para o Estado equatoriano.

Já o ministro de Setores Estratégicos, Galo Borja, afirmou que o seu governo aguarda o resultado de uma auditoria financeira para determinar se cumprirá com o pagamento da dívida. “Está sendo realizada uma auditoria tanto da parte financeira como da parte técnica. Uma vez que tenhamos (o resultado), tomaremos uma decisão”, disse, explicando que “nada está definido”.

Em Nova Délhi, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, ressaltou que se o governo Correa não honrar o empréstimo será o fim da relação comercial entre Brasil e Equador. “Então, vai acabar o comércio entre Brasil e Equador porque o empréstimo é lastreado no Convênio de Pagamentos e Créditos Recíprocos (CCR). Eu não entendo como deixar de pagar, porque tem a garantia do CCR, que é uma garantia comercial.”

Amorim destacou que, se houve uma irregularidade, ela não foi praticada pelo BNDES. O ministro criticou o número de pessoas que indagam sobre as negociações e outras que dão palpite. “Tem muito ministro de lá dando palpite”, afirmou. O assessor especial da Presidência para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia, adotou um discurso parecido e disse na tarde de ontem que a melhor solução para os problemas enfrentados por empresas brasileiras no Equador é um “entendimento direto” entre os presidentes Lula e Rafael Correa. “Tem muito ministro falando, e quando tem muita gente falando, dá cacofonia”, comentou.

 

Expulsão

Hoje vence o prazo de 48 horas dado por Correa para os executivos brasileiros das duas empresas brasileiras deixarem o Equador. Ao todo, cinco funcionários de Furnas e quatro da Odebrecht tiveram seus vistos revogados por um decreto executivo de 9 de outubro. Uma fonte disse ao Correio que Eduardo Gedeon, advogado da Odebrecht — cujo escritório ficava em Lima, no Peru —, voltou ontem ao Brasil. O engenheiro Fernando Bessa teve ainda que se desfazer de sua casa em Quito, mas também retorna hoje ao Brasil.

A Direção Nacional de Migração do Equador avisou aos aeroportos e postos de fronteiras para cumprir a determinação presidencial. Newtton Goulart Graça e Carlos Reis, funcionários da estatal Furnas-Centrais Elétricas, já deixaram o Equador, enquanto Ricardo Thadeu Gonçalves, José Francisco Farage e Devorcir Magalhaes não aparecem no sistema de migração.

O governo equatoriano acusou a Odebrecht pelas falhas técnicas da hidrelétrica de San Francisco, mas a empresa alega que concluiu os consertos antes do prazo. A empresa Furnas-Centrais Elétricas foi expulsa por não ter fiscalizado a construção da obra. A estatal se defende dizendo que “realizou este serviço, que consistiu em acompanhar os processos construtivos e suas conformidades em relação às especificações contidas no respectivo projeto”. Ambas as empresas sustentam ter seguido projetos equatorianos, aprovados pelo governo desse país.

A briga com as empresas brasileiras poderá custar caro ao Equador. Somados, quatro dos cinco contratos com a Odebrecht chegam a US$ 712.658.042,98. Já o projeto do governo brasileiro de conexão multimodal dos portos de Manta e Manaus (AM), passando pelo território peruano, previa o investimento de cerca de US$ 1 bilhão pelo Brasil. O eixo foi cancelado por tempo indeterminado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O próprio Correa admitiu que esse seria o maior projeto de seu governo. A construção facilitaria também o transporte de produtos equatorianos à Zona Franca de Manaus e à Amazônia.


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