quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Brasil e Equador ensaiam distensão

Vizinhos avisam que vão esperar decisão da Corte antes de consumar o calote no BNDES

Ayr Aliski

BRASÍLIA

 

A crise deflagrada pela ameaça de calote do governo do Equador no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) começa a dar sinais de distensão. Ontem, no mesmo dia em que a diplomacia brasileira pediu que o tema deixe de ser tratado como calote, o ministro de Setores Estratégicos do Equador, Galo Borja, confirmou que o país continuará a honrar a dívida de US$ 243 milhões contraída junto ao banco de fomento até uma decisão da corte arbitral de Paris.

– Não vamos falar em calote, porque não foi isso o que houve – afirmou o embaixador do Brasil em Quito, Antonino Marques Porto e Santos, ao participar de audiência pública na comissão de Relações Exteriores do Senado para tratar do assunto. – O que houve foi uma indicação por parte do presidente (Rafael) Correa, cujos elementos principais nós não conhecemos os detalhes.

O crédito, de US$ 243 milhões, foi concedido para a construção da hidrelétrica de San Francisco pela empreiteira brasileira Odebrecht. Menos de um ano antes de ser concluída, a usina apresentou problemas, o que provocou a paralisação das operações por quatro meses. Na última quinta-feira, quando anunciou que havia oferecido na véspera o recurso à Corte de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional, sediada em Paris, Correa ameaçou suspender imediatamente o pagamento. A ameaça, porém, não foi concretizada.

O embaixador Porto e Santos confirmou que a primeira parcela devida ao BNDES já foi paga. O próximo vencimento, de US 28 milhões, vence em 29 de dezembro. Por isso, preferiu tratar as declarações de Correa como ameaça. As autoridades brasileiras preferem não considerar a pior hipótese, por avaliar que poderia abalar a credibilidade do CCR, o Convênio de Pagamentos e Créditos Recíprocos.

 

Caráter irrevogável

O CCR é um mecanismo de compensações entre os bancos centrais dos países que compõem a Associação Latino-Americana de Integração (Aladi). O ministro de Setores Estratégicos do Equador, Galo Borja, disse à imprensa equatoriana que só vai deixar de pagar o BNDES caso haja uma decisão favorável da Corte de Arbitragem.

Ontem, o BNDES foi oficialmente notificado pela Corte de que o governo equatoriano deu entrada no processo para cancelar o pagamento. Em 21 de novembro, nota do BNDES indicou que "o curso da operação no CCR confere à dívida caráter irrevogável e irretratável" e que "o não pagamento implica inadimplência do banco central devedor com os demais bancos centrais signatários do convênio". O entendimento é que a dívida do Equador com o BNDES é, portanto, parte da dívida externa.

Se houver decisão por não pagar o que deve pela usina de San Francisco, restará apenas a alternativa do Equador revogar a sua participação no CCR. A perda de credibilidade no CCR faria com que novas obras tivessem de ser pagas por meio de outros mecanismos – o que aumentaria custos, uma vez que exigiria maiores gastos com seguro. Um executivo do BNDES afirmou que, nas operações via CCR, o seguro tem um componente político.

O certo é que com pagamento ou com calote, as relações entre Brasil e Equador mudaram. É a primeira vez desde a Guerra do Paraguai que o Brasil chama de volta um embaixador da América Latina.

– Fui chamado pelo chanceler Amorim para consultas. Consultas significa um reexame das relações bilaterais à luz do que sucedeu. A partir daí serão tomadas decisões – disse Porto e Santos, que evitou comentar o impacto para outras operações bilaterais com o Equador.

A Odebrecht tem outros projetos em andamento no Equador, que demandaram US$ 650 milhões em investimentos. Entre os quais, a hidrelétrica Toachi-Pilatón, o sistema de irrigação Carrizal-Chone, o projeto Baba, de abastecimento de água e construção de uma pequena usina, além do aeroporto de Tena, na região amazônica. Por conta dos problemas em San Francisco a Odebrecht foi expulsa do país.

 

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