quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Itamaraty baixa o tom da crise

Em depoimento no Senado, embaixador em Quito aponta “sinais positivos” e nega que o BNDES tenha sofrido calote. Diplomata diz que reação do governo foi “correta”, mas oposição cobra firmeza

Isabel Fleck 

Da equipe do Correio 

 

Após o mal-estar criado com a decisão anunciada pelo governo equatoriano de não pagar uma dívida de US$ 242,9 milhões com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o governo brasileiro tentou ontem amenizar o tom em relação ao país vizinho. Em audiência pública na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, o embaixador brasileiro em Quito, Antonino Marques Porto e Santos, negou que tenha havido calote e disse que o governo de Rafael Correa tem dado “sinais positivos” em relação ao tema. O diplomata também elogiou várias vezes a decisão do Itamaraty de convocá-lo para vir ao Brasil a fim de reavaliar as relações bilaterais. Horas antes, o assessor para Assuntos Internacionais da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, tinha dito que é preciso “deixar a coisa decantar”. 

“Não vamos falar em calote, porque não foi isso que aconteceu. O que houve foi uma indicação, por parte do presidente Correa, no discurso de apresentação de um relatório sobre a dívida externa equatoriana, de que ele recorrerá à Corte Internacional de Paris”, disse o embaixador. Ele lembrou que a primeira parcela da dívida já foi paga. Segundo Antonino, a decisão de Quito de questionar a dívida contraída para construir a hidrelétrica de San Francisco — obra realizada pela construtora brasileira Odebrecht — perante a Câmara de Comércio Internacional (CCI) faz parte de uma política muito mais ampla do governo equatoriano. “Eles estão revendo toda a questão da dívida externa. Isso está na plataforma política de Correa”, argumentou. 

O ministro de Setores Estratégicos do Equador, Galo Borja, disse à agência France-Presse que o país continuará pagando o empréstimo ao BNDES até que saia a decisão judicial na CCI. A notícia, segundo Antonino, é um bom sinal. “Não é necessariamente uma demonstração de abertura, mas é a indicação de uma maneira muito positiva de tratar a questão”, disse. A próxima parcela, no valor de US$ 18 milhões, vencerá no fim deste mês. Segundo o embaixador brasileiro, a dívida com o BNDES pode chegar a US$ 462 milhões, somados juros e encargos. 

 

Perplexidade 

Diante dos questionamentos dos senadores sobre a reação do governo brasileiro, Antonino foi enfático ao responder, várias vezes, que a decisão do Itamaraty de chamá-lo ao Brasil para conversar foi acertada. “A reação do governo brasileiro foi muito adequada ao tipo de situação, e demonstrou, de modo diplomático, a perplexidade e o desconforto com a decisão do Equador”, disse. O embaixador revelou que, nos últimos dias, autoridades brasileiras e equatorianas têm mantido contato e que, em Brasília, o governo está reavaliando cerca de 30 acordos de cooperação bilateral. Entre eles está o corredor Manta-Manaus — que ligaria os oceanos Atlântico e Pacífico — e que, segundo o diplomata, está “um pouco sub judice”. 

Para o presidente da Comissão, senador Heráclito Fortes (DEM-PI), o Brasil “não pode cochilar” neste momento. “O presidente Correa, tentando dar satisfação ao povo do seu país por um motivo que não vem ao caso, está tentando fazer uma empresa brasileira de bode expiatório e, acima de tudo, passar um calote em um banco do governo brasileiro, o que nós não podemos aceitar”, disse Fortes. O senador ainda criticou o fato de o BNDES ter investido tamanha quantia no exterior sem consentimento do Legislativo. “É inaceitável que esse dinheiro todo saia do Brasil sem autorização do Congresso Nacional, por meio de sua Comissão de Assuntos Econômicos. Se empréstimos do BNDES para governos estaduais têm que passar, por que não o que vai lá para fora?”, questionou.

 

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