quinta-feira, 27 de novembro de 2008

No Brasil, Medvedev tenta driblar crise

DEFESA
DEFESA@NET 25 Novembro 2008
Folhaonline 24 Novembr 2008 

Brasil - Rússia
No Brasil, Medvedev tenta driblar crise 

Em momento delicado para Moscou, presidente russo desembarca
hoje no Rio dentro de viagem que inclui Cuba e Venezuela
Kremlin visa estreitar laços na antiga área de influência dos EUA, 
mas esbarra em queda do preço do petróleo e em atritos com ex-rivais

IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA 


O presidente da Rússia, Dmitri Medvedev, desembarca hoje à noite no Rio para a segunda etapa de um giro latino-americano no qual pretende vender a nova dimensão estratégica de seu país.

Embora Medvedev (pronúncia aproximada: "midviêdef)" esteja efetivamente brincando no quintal geopolítico dos Estados Unidos, promovendo sua aliança com a antiamericana Venezuela e tentando fortalecer laços com o Brasil, a quantidade de problemas recentes em casa tirou um pouco da desenvoltura dos russos.

No Brasil, assinará acordos de cooperação e tentará engatilhar vendas de armas, algo difícil (leia texto ao lado).

O cenário inicial era favorável ao Kremlin. Medvedev chega em um momento em que seu país humilhou o Ocidente na guerra de agosto com a Geórgia. Moscou só não ocupou todo o pequeno país para poder garantir uma volta rápida da Europa à mesa de negociações -o que já ocorreu.

Ontem, em seu segundo dia de viagem, lembrou de suas "diferenças" ao encontrar-se com o colega americano George W. Bush na cúpula de países da Ásia e do Pacífico em Lima, Peru. "A despeito da existência de pontos em que nós divergimos pesadamente, nós temos trabalhado bem e vamos continuar esse trabalho", disse o russo, que ainda tirou uma casquinha do presidente que deixa o cargo em janeiro: "Ficaremos felizes em recebê-lo na Rússia". Um assessor ainda sugeriu: "Ele pode ir pescar", disse Sergei Prikhodko a agências de notícias.

Agenda de crise

Só que será com Barack Obama, e não Bush, com quem Medvedev e seu líder político, o premiê Vladimir Putin, irão negociar a partir de 2009. E a agenda é extensa, incluindo Geórgia, o sistema antimísseis que os EUA querem instalar na Europa, terrorismo, expansão da Otan, entre outros.

Os problemas para Medvedev não param aí. Todo o ressurgimento geopolítico da Rússia nos oito anos de governo Putin foi lastreado no apetite mundial por hidrocarbonetos. Com o barril de petróleo na casa dos US$ 50 e uma recessão mundial em desenvolvimento, os dólares para financiar as aventuras russas ficam comprometidos. Além disso, o mercado de ações e o sistema bancário do país estão sofrendo pesadamente com a vertente financeira da crise global.

Por isso, cabe especial atenção à terceira perna da viagem de Medvedev, Caracas. Lá, o presidente Hugo Chávez assinará acordos energéticos com os russos sentindo o peso do mesmo problema, a queda no preço do petróleo que lhe garante coisas como compras de US$ 5 bilhões desde 2005 em armamentos da Rússia. É de se esperar que ambos adotem a cautela retórica sobre Washington, à espera de Obama.

Isso não muda dois fatos que são vistos com preocupação nos meios militares americanos. Primeiro: depois de exercícios com dois bombardeiros estratégicos usando bases venezuelanas, uma frota naval russa fará exercícios com navios de Chávez no Caribe -o venezuelano anunciou que a esquadra chegaria já ontem ou hoje.

Segundo: na etapa final do giro, Medvedev irá ao antigo satélite de Cuba, onde pretende estabelecer uma nova cooperação militar -interrompida com o fim da União Soviética em 1991. Há rumores de que bases cubanas possam servir de apoio logístico à aviação de longo alcance russa, embora alguns analistas duvidem da real capacidade operacional de Moscou.

Com uma agenda de crise, o giro de Medvedev não terá o brilho esperado em Moscou, mas nem tampouco pode ser descartado do ponto de vista de novidade geopolítica.



Rússia busca ampliar venda militar ao Brasil 

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA


Em sua primeira visita ao Brasil, Dmitri Medvedev assinará os acordos de cooperação bilateral costumeiros desse tipo de viagem. Mas um dos grandes interesses de sua delegação está nos bastidores, na tentativa de recuperar o espaço perdido para a França no campo de intercâmbio militar.

Com efeito, a grande esperança dos diplomatas russos é poder anunciar durante a visita o fechamento de um negócio de US$ 250 milhões que vem se desenrolando há dois anos, a compra de 12 helicópteros de transporte e ataque Mi-35 para a Força Aérea Brasileira. A FAB desconversa.

O nó a ser desatado é a exigência de que fossem instalados aviônicos israelenses feitos no Brasil pela empresa AEL, o que os russos consideravam antieconômico numa compra tão pequena.

De certa forma, a questão resume o principal problema nas sempre travadas negociações comerciais entre os dois países. O Brasil defende que não quer fazer compras de prateleira, exigindo contrapartidas comerciais e tecnológicas. A Rússia concorda, mas demanda escala para que isso seja viável -como nos acordos para produção de aviões de caça seus na Índia e na China.

Além dos helicópteros, os russos irão ofertar aviões de treinamento básico Yak-130 e sistemas de mísseis, mas essas ainda são negociações incertas.

Com uma nova política de defesa sendo elaborada a passos lentos pelo governo brasileiro, contudo, Paris ultrapassou Moscou e tornou-se a parceira estratégica preferencial. O primeiro sinal foi a retirada da lista de finalistas para fornecer o novo caça da FAB, motivada também pelo temor de um alinhamento com a grande compradora de armas russas na região, a antiamericana Venezuela, assim como considerações técnicas.

Mas isso não deverá mudar o peso que a Rússia tem como parceiro comercial no campo de carnes, principais produtos na pauta exportadora do Brasil para o país.

As exportações brasileiras para a Rússia subiram de US$ 423 milhões em 2000 para US$ 3,7 bilhões no ano passado. Já o Brasil comprou US$ 1,7 bilhão em produtos russos em 2007. A Câmara de Comércio Brasil-Rússia espera que o volume entre os países chegue a US$ 7 bilhões neste ano, e a US$ 10 bilhões em 2010.

Medvedev, que chega hoje ao Rio e fará turismo amanhã pela cidade, será recebido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva com um churrasco no Palácio das Laranjeiras.

Na quarta-feira, assinarão um acordo de cooperação nuclear e outros visando acabar com a exigência de vistos entre os dois países. Memorandos na área energética também devem ser assinados

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