quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Governo tenta evitar que STF mude área da reserva indígena

Vasconcelo Quadros e Luiz Orlando Carneiro, Jornal do Brasil

BRASÍLIA - Uma força-tarefa encabeçada pela Advocacia Geral da União (AGU) vai trabalhar a partir desta quarta-feira para que o Supremo Tribunal Federal (STF) mantenha na íntegra o decreto do presidente Lula que homologa em área contínua os 1,7 milhão de hectares que compõem a Reserva Raposa/Serra do Sol, em Roraima. O ministro da Justiça, Tarso Genro, sustentou nesta terça-feira que a decisão está amparada na Constituição e alertou que a eventual anulação do decreto criará um clima de instabilidade que poderá afetar todas as outras reservas em área contínua já demarcadas e pacificadas com com a chancela do governo em outras regiões do país.
– Nosso desejo é a manutenção da demarcação, que está plenamente de acordo com todos os procedimentos até o momento adotados para a demarcação de terras indígenas. Se for determinada a descontinuidade da reserva, poderá ser aberto um contencioso infinito com relação a outras demarcações – explicou.
A decisão do STF pode implicar na revisão de outras 615 reservas demarcadas a partir de 1988, que representam um total de 109, 6 milhões de hectares ou 13% do território nacional. Numa outra linha da questão fundiária do país, seria como se o STF considerasse ilegal os decretos de desapropriação de terras já destinadas à reforma agrária.

Dois grupos
A sessão que começa nesta quarta-feira no STF vai reunir num mesmo ambiente defensores da demarcação de terras indígenas e fazendeiros e desenvolvimentistas.
– O problema não é só de Roraima. Mato Grosso do Sul corre o risco de perder um terço de suas terras para as reservas. O que se decidirá no Supremo terá reflexo no resto do país – diz o líder dos arrozeiros e prefeito de Pacaraima (RR), Paulo César Quartiero, que elegeu como adversários três órgãos do governo – Polícia Federal, Ibama e Funai – que ele chama de "tridente do diabo". Em abril, Quartiero foi preso sob a acusação de ter mandado seus funcionários atacare ferir 10 manifestantes indígenas em uma de suas propriedades. Ao deixar a cadeia, recebeu uma multa de mais de R$ 30 milhões por danos ao meio ambiente.
O ministro Tarso Genro esteve nesta terça-feira no STF, mas apenas para participar da solenidade de lançamento do sistema on-line de restrição judicial de veículos, no Conselho Nacional de Justiça, ao lado do presidente do CNJ, ministro Gilmar Mendes. Os dois não conversaram sobre o início do julgamento, nesta quarta, da ação-piloto proposta pelos senadores Mozarildo Cavalcanti (PTB) e Augusto Botelho (PT), ambos de Roraima, contra a demarcação contínua da reserva de 1,7 milhão de hectares, que provocará a extinção de municípios e vilas ocupados por não-índios, e que trabalham em arrozais responsáveis pelo setor mais produtivo da economia do Estado, segundo os autores da ação.
Com relação a providências a serem tomadas pela Polícia Federal e pela Força de Segurança Nacional - que mantêm contingentes na região – a fim de evitar ou enfrentar conflitos entre índios e não-índios, qualquer que seja a decisão do STF, Tarso Genro limitou-se a dizer que não será "por falta de ação civilizada, técnica e qualificada da PF" que qualquer decisão deixará de ser cumprida.
– A decisão do STF vai incidir sobre uma situação jurídica que já estava estabilizada - comentou o ministro. – E essa estabilização foi prejudicada pela incursão de pessoas que ocuparam terras públicas, de propriedade da União, e terras indígenas, e lá começaram a produzir. Não se trata de um juízo de criminalização dessas pessoas, mas certamente tais pessoas lá estão ilegalmente.
Para Tarso Genro, qualquer território indígena é "propriedade da União, que tem, sobre ela, soberania plena".

Nenhum comentário: